sábado, 6 de novembro de 2010

Capítulo 14

 Decisões


           Suspirei antes mesmo de abrir os olhos, e quando voltei a inspirar descobri que à minha volta pairava um cheiro delicioso: chocolate misturado com… o nome que me surgiu nesse momento foi "essência de Chris." Sorri. Só então abri os olhos. E ali estava ele.
            Tinha dormido a noite inteira ao meu lado. Parecia um anjo a dormir. Olhei à nossa volta mas nem Niza nem Sophie estavam nas suas camas. Deviam ter ficado no quarto de Ryan e Peter. Sorri mais ainda, sentindo-me feliz por ter amigas daquelas. Percebiam toda e qualquer situação em que eu precisava que elas ficassem fora do quarto.
            Chris mexeu-se nesse momento, e depois os seus olhos abriram-se e cravaram-se nos meus enquanto um sorriso rasgava os seus lábios.
            - Bom-dia, Kia.
            Sorri e torci-me para o beijar. Depois, subitamente, a dor de cabeça atingiu-me.
            - Oh não…
            - O que se passa?
            - Acho que estou de… ressaca.
            Chris riu-se e abraçou-me.
            - Vamos ficar aqui os dois de ressaca o dia todo, pode ser?
            - Quem me dera…
            Mas não podia ser. De certeza que haveriam aulas à tarde e tínhamos de chegar a tempo do almoço. Mas realmente não me apetecia sair dali.
            Como é que, de um momento para o outro, tudo tinha ficado tão claro na minha cabeça?!
            No entanto, as minhas opiniões e a minha maneira de ver a situação dividiam-se em duas vertentes diferentes, quase como uns prós e contras.
            Versão cor-de-rosa (aquela em que eu queria mesmo viver): eu gostava de Chris e ele gostava de mim. Éramos felizes. Niza, Sophie, Ryan e Peter estavam do nosso lado, queriam ver-nos juntos, tudo parecia a meu favor. De certeza que John também ficaria contente por ver que eu arranjara alguém de quem gostava mesmo a sério. Chris, para além de ser o primeiro namorado que eu tinha, era super meigo e parecia realmente gostar de mim. E além disso, tinha aquele dom que eu adorava: ele lia os meus pensamentos, sabia sempre o que eu queria, nunca me desiludiria porque sabia tudo o que devia e não devia fazer comigo. Além de que era super giro e tinha um óptimo sentido de humor… pronto, era o namorado perfeito.
            Versão real (e nada promissora): eu tinha-me passado e tinha curtido com o meu melhor amigo na festa de Halloween. O meu melhor amigo? Agora já nem sabia se lhe podia chamar isso ou não! Estava demasiado bêbeda para pensar em qualquer coisa e limitara-me a fazer aquilo que queria. Mas agora que acordara para um novo dia, o mundo encantado da noite das bruxas tinha desaparecido e eu tinha de voltar a ser a Kiara Williams, com tudo controlado ao pormenor, sempre prestes a ter um ataque de stress. A rapariga que tinha de lutar contra Kalissa.
            Kalissa… ela não ia facilitar nada as coisas. Na noite anterior tinha-se aproveitado da situação para beijar Chris as vezes que quisesse. Não que ela gostasse minimamente dele, quisera apenas usá-lo. Revirei os olhos só de pensar nela. Era a pessoa que eu mais odiava no mundo. E havia de descobrir uma maneira de me vingar de tudo o que ela fazia.
            Olhei para Chris. Ele fixava o olhar no meu, apaixonadamente. Senti o meu estômago a contrair-se só de pensar em magoá-lo. Ele não merecia nem tinha culpa de nada. Estava a ser fantástico comigo… e de certeza que Kalissa o ia magoar. Suspirei e puxei-o mais para mim, abraçando-o com todas as minhas forças.
            Agora era tarde para voltar atrás. Já não podia nem aguentava manter-me longe dele. E não podia deixá-lo desprotegido para enfrentar a víbora. Tinha de protegê-lo dela custasse o que custasse.
            Chris abraçou-me, beijando-me no pescoço.
            - O que é que tens? Pareces preocupada.
            - Não é nada…
            E subitamente, senti uma vontade louca de chorar. Devia estar a dar em doida. Ainda há pouco me sentira tão feliz e agora… só me apetecia chorar. Fechei os olhos para conter as lágrimas. Onde é que eu tinha a cabeça para ter deixado que Chris me beijasse? Ele ia sair magoado daquela história toda e eu não queria mesmo nada.
            - Kia…
            - Tens de ouvir uma coisa. Não vais gostar mesmo nada mas é mesmo importante que percebas…
            - Sim?
            Baixei-me até o meu rosto ficar ao nível do seu e sorri, tentando mais que nunca conter as lágrimas. Depois beijei-o levemente.
            - Ninguém pode saber que dormiste aqui comigo.
            Ele ficou confuso.
            - Ninguém pode saber que… aconteceu aquilo tudo entre nós.
            - Mas o Ryan… e os outros, eles já sabem!
            Suspirei. Eu tinha deixado que a situação escapasse ao meu controlo. Agora teria de sofrer as consequências.
            - Além deles, ninguém pode saber o que aconteceu.
            - Mas porquê? - Perguntou ele, começando a ficar apreensivo.
            - Porque, Chris… o que se passa comigo é mais complicado do que tu pensas…
            - Se tu me explicasses talvez deixasse de ser.
            Eu queria explicar. Sentia uma necessidade enorme de lhe contar o meu segredo, mas era melhor que ele ainda não o soubesse. Eu não conseguia adivinhar a reacção da Kalissa caso eu destruísse o seu disfarce. A sua raiva seria implacável e eu não podia permitir que Chris sofresse mais do que eu própria o faria sofrer. Passei a mão pelo seu cabelo sedoso e contive as lágrimas.
            - Não posso.
            - Porquê?
            - Não é algo que consiga explicar muito bem. Preciso apenas que entendas… que não podemos estar juntos em público.
            Os seus olhos azuis-claros semicerraram-se de desconfiança.
            - Eu não te estou a conseguir entender.
            Suspirei. Depois cravei o olhar no seu com todas as minhas forças, deixando a descoberto os meus sentimentos, sem barreiras, sem paredes invisíveis, sem contradições. Chris apertou-me com mais força contra o seu peito musculado ao perceber o que eu estava a fazer mas limitei-me a esperar e a deixá-lo tirar as conclusões que quisesse.
            - Ah… deve ser mesmo muito complicado…
            - É mesmo.
            - Mas eu já te disse montes de vezes que podes confiar em mim.
            Assenti e acariciei-lhe o rosto outra vez.
            - Eu sei disso. Mas… vou dar-te uma pista.
            Ele ficou ansioso, entusiasmado com a ideia de me perceber mais um pouco. Inspirei bem fundo para me preparar.
            - O meu segredo… pode magoar as pessoas.
            Ele esperou uns momentos, como se não estivesse a entender o que eu queria dizer, e depois fez-me sinal que continuasse.
            - Magoar fisicamente. - Murmurei, e desta vez ele reagiu como eu esperava: ficou preocupado.
            - Fisicamente?         
            - Sim. Não te posso dizer mais nada, apenas que… se eu o contar a alguém, essa pessoa vai sofrer e muito.
            - Isso não tem lógica nenhuma.
            - Talvez… mas é assim que eu sou.
            Chris manteve o olhar fixo em mim durante longos minutos e depois suspirou e pousou o queixo sobre os meus cabelos, embalando-me contra si.
            - Não sei se consigo lidar com isso.
            - Eu não te obrigo… - E um nó de ansiedade começou a crescer na minha garganta, dificultando-me a tarefa de falar. - Eu gosto de ti, Chris, mesmo a sério, mas não suporto magoar-te.
            - Nem eu a ti. E se te estou a magoar por te pressionar tanto… eu vou tentar controlar a minha curiosidade.
            Aquilo espantou-me. Pensei que ele fosse deixar-me depois do que eu lhe tinha dito, mas parecia que isso ainda o deixaria mais agarrado a mim. Como era possível haver rapazes destes no mundo?!
            - Tu tens noção de que… namorar comigo traz graves riscos à tua saúde física e à tua sanidade mental? - Sussurrei, nervosa.
            Ele riu-se baixinho, beijando-me na testa.
            - Não acho que sejas assim tão perigosa. Aliás… eu consigo lidar com o teu segredo, seja ele qual for. Não te preocupes, eu vou continuar aqui ao teu lado.
            - Obrigada.
            Foi tudo o que consegui dizer. Depois torci-me e beijei-o outra vez. Só a simples ideia de que ele me pudesse deixar por causa de Kalissa causava-me um pânico interior que me fazia tremer dos pés à cabeça. E agora as suas palavras tinham entrado na minha mente para nunca mais de lá saírem. Ele ia ficar comigo. Mesmo sabendo que se podia magoar, ele queria ficar comigo.
            - Só para que saibas… sou um bocado masoquista. - Riu-se ele.
            Eu ri-me também e depois ele rolou para se deitar sobre mim. Ficámos a olhar um para o outro durante muito tempo, e eu sentia-me tão bem ali que não consegui pensar em mais nada. Perdida naquele mar de azul-turquesa que eram os seus olhos, eu sentia-me… feliz.
            - Ah, e não te esqueças que eu tenho ataques de amnésia. - Sussurrei, preocupada com o que ele podia pensar daquilo.
            - Hum… isso não vai ajudar muito, sabes…
            - Pois, eu avisei-te.
            - Mas não te preocupes. Acho que sou perfeitamente capaz de te lembrar do que aconteceu entre nós quando te esqueceres.
            Sorri e agarrei o rosto dele entre as minhas mãos. Depois beijei-o com todas as minhas forças e deixei-me levar pelo momento.


            A parte mais complicada, pelos vistos, já tinha passado.
            Depois de nos termos arranjado, descemos para o salão de refeições, que voltara ao seu aspecto normal do dia-a-dia, como se a festa do Halloween não passasse de uma bela miragem. Niza e Sophie estavam sentadas na mesa do 11º ano a conversar sobre qualquer coisa e calaram-se assim que eu e Chris nos aproximámos. Niza fixou o olhar em mim e depois um sorriso de alegria rasgou os seus lábios carnudos.
            - Oh boa, finalmente! - Cantarolou.
            Levantou-se e lançou os braços em volta do meu pescoço, rodopiando à minha volta enquanto ria à gargalhada. Eu abracei-a também e juntei a minha gargalhada à sua. Niza tinha ficado feliz pela minha… estranha união com Chris. Sim, estranha, porque eu não sabia dizer o que nós éramos. A única certeza que tinha era que o amava. Sophie levantou-se também e juntou o seu abraço ao de Niza.
            - Estamos tão felizes por ti! - Disse ela.
            E eu sabia que era verdade. Chris sentou-se no banco e ficou a olhar para nós, contendo o riso que queria soltar. Não era possível elas ficarem mais entusiasmadas, nem que eu dissesse que ia casar. Enfim…
            Ryan e Peter surgiram nesse momento e vieram juntar-se a nós.
            - Ryan, sabes da nova? O Chris e a Kiara namoram! - Gargalhou Sophie.
            Ryan sentou-se do outro lado de Chris e Sophie sentou-se ao lado dele, abraçando-o. Ah, afinal nós não tínhamos sido os únicos a assumir. Ryan beijou-a e depois sorriu-me.
            - Ainda bem, já não era sem tempo.
            Sorri-lhe. Era bom saber que ele estava do meu lado. Depois Peter deu um soco no braço de Chris, e riu-se.
            - Espero que tenhas mais sorte com ela do que eu tive.
            Engoli em seco. Não era bem aquilo que eu queria ouvi-lo dizer. Preferia que Peter esquecesse o que tinha acontecido.
            E depois lembrei-me… e se Kalissa magoasse Chris como magoara Peter? E se eu também tivesse de acabar com ele dali a uns tempos, porque ele não aguentava namorar comigo e com Kalissa? Um arrepio subiu-me pelas costas. Não ia permitir que ela estragasse tudo desta vez.
            - Kiara? Estás a ouvir-me?
            Niza pegou na minha mão e fez-me sentar ao seu lado, enquanto eu ainda pensava numa maneira de manter Chris a salvo. E não apenas ele, mas todos os membros do meu grupo, todas as pessoas de quem eu gostava.
            - Ouçam. - Chamei.
            Ryan, Sophie, Niza e Peter olharam fixamente para mim. Chris colocou-se atrás de mim, pousando as mãos nos meus ombros, e suspirou. Ele já sabia o que eu ia dizer aos meus amigos. Só esperei que eles reagissem tão bem quanto… o meu namorado. Sim, acho que já lhe podia chamar isso.
            - Há uma coisa que vocês precisam de saber.
            Eles mostraram-se curiosos, tal como eu pensara que ficariam.
            - O que se passa? Mais revelações? - Perguntou Peter.
            - Sim… quer dizer, não… é mais um aviso que tenho de vos fazer.
            Niza estava agora petrificada a olhar para mim, como se por algum acaso do destino já soubesse aquilo que eu ia dizer.
            - Não podem dizer a ninguém que eu namoro com o Chris. Entendido? A ninguém.
            - Mas…
            - Sophie, ela tem razão. É melhor assim. - Revelou Chris, em voz baixa.
            Eu dei-lhe a mão e senti-me agradecida por ele ter ficado do meu lado.
            - Mas isto agora é secreto? Algum plano altamente perigoso?
            - Mais ou menos Ryan. Mas preciso mesmo que não contem isto a ninguém. Eu e o Chris nem vamos mostrar-nos muito em público nem nada.
            - Queres explicar-nos a razão para tudo isto? - Perguntou Sophie, de olhos semicerrados.
            - Não posso. É demasiado complicado. Mas preciso que fiquem do meu lado e que não falem disto com ninguém. E vocês rapazes, nada de tocar no assunto ao pé dos Desportistas, ouviram?
            - Está bem, tu é que sabes…
            Suspirei. Eles deviam estar a pensar que eu era mesmo uma anormal de todo o tamanho, mas eu faria tudo para os proteger das más intenções de Kalissa.
            Fomos buscar a comida de seguida, e Chris sentou-se ao meu lado. Ao ver-me tão embrenhada nos meus pensamentos, pareceu ficar nervoso.
            - Não estou a conseguir apanhar o que estás a sentir neste momento. - Segredou junto ao meu ouvido.
            - Ansiedade. Medo. Confusão.
            - Porquê?
            - Porque…
            Virei-me de frente para ele e olhei para aqueles olhos deliciosamente lindos. Como é que eu conseguia esconder-lhe tantas coisas? A minha capacidade de mentir e esconder surpreendia-me mais a cada dia que passava.
            - É pela tua segurança. Eu gosto de ti, não quero que nada te aconteça.
            - Nada vai acontecer-me, está descansada.
            - Não tenho certezas disso…
            Depois continuei a comer sem dizer mais nada. Eu ia arranjar uma maneira de fazer com que ele não desconfiasse tanto. Só tinha de pensar muito bem numa…
            Assim que acabei de almoçar, levantei-me e despedi-me deles.
            - Onde vais? - Perguntou Ryan.
            - Falar com uma pessoa.
            E saí do refeitório, correndo escadas acima e atravessando os corredores que me separavam dos aposentos do meu padrinho. Quando lá cheguei bati à porta e ele deu-me ordem para eu entrar.
            - Olá Kiara! - Sorriu ele, ao ver-me entrar.
            - Olá John. - Entrei e fechei a porta. - Podemos falar?
            - Claro, claro, senta-te!
            Fiz o que ele disse e depois preparei-me para lhe dar a notícia. Aquilo conseguia ser ainda mais embaraçoso do que na vez em que eu lhe pedira autorização para ir com Peter ao cinema.
            - Passa-se alguma coisa? - Perguntou ele.
            - Sim… tenho algo para lhe contar.
            - Então?
            - Bem… eu comecei a namorar com o Chris. Já lhe tinha falado dele algumas vezes, não já?
            - Sim, e eu sei bem quem ele é. Mas tens a certeza que gostas dele?
            - Sim, absoluta. Mas o meu medo neste momento… é a Kalissa.
            - A Kalissa? - John mostrou-se surpreendido.
            - Sim. Se ela descobre que eu namoro com o Chris vai arranjar maneira de o magoar. Eu tenho a certeza absoluta disso.
            - Mas como é que pensas manter a relação em segredo?
            - Não faço a mínima ideia.
            Suspirei e baixei a cabeça.
            - Os vossos amigos já sabem?
            - Sim… não fui capaz de lhes esconder… nem o Chris.
            - E achas que eles conseguem manter o segredo?
            - Espero mesmo muito sinceramente que sim. A Mariah e as outras Raparigas da Claque não podem saber o que se passa, senão vão contar à Kalissa e ela arranja maneira de me tornar a vida num Inferno.
            - Pois, eu compreendo.
            - Então o que hei-de fazer? Eu gosto demasiado dele para o deixar…
            - Mas por namorares com ele estás a colocá-lo numa posição complicada e perigosa.
            - Eu já lhe disse isso. Mas ele é forte; ele continuou ao meu lado.
            - Hum… isso altera algumas coisas…
            - John, não sou capaz de o deixar desprotegido, sendo um alvo fácil para a Kalissa! Ele não é como o Peter; eu adoro-o de mais para o deixar.
            Os olhos de John adquiriram um brilho paternal.
            - Se é isso que queres tens o meu apoio.         
            - Obrigada.
            - E se precisares de alguma coisa sabes que estarei aqui para te ajudar no que puder.
            Sorri, satisfeita.
            - Obrigada John. Eu só vim cá mesmo dizer-lhe isto. Quero mantê-lo informado do que acontece.
            - Ainda bem que pensas dessa maneira. Agora podes ir se quiseres. Esta tarde já tens aulas normais.
            - OK… obrigada mais uma vez.
            Ele sorriu-me uma última vez antes de eu sair.
            Depois encaminhei-me para a Sala de Convívio, onde sabia que o meu grupo estaria reunido. E preparei-me para recomeçar de novo a minha rotina na Blackstone Private School.


            Os dias foram passando. Eu sentia uma pressão nova sobre os ombros: a de não deixar que Mariah e as suas amigas descobrissem que eu namorava com Chris. Nos treinos da Claque eu esforçava-me ao máximo mas fora deles nunca passava muito tempo com elas e com os Desportistas. Niza e Sophie ficavam muito mais contentes por me terem sempre ao pé delas.
            Kalissa e eu fomos trocando algumas vezes nas duas semanas seguintes, o que não ajudava mesmo nada. Quando ela ganhava o poder fazia o que queria e bem lhe apetecia e brincava com toda a gente. Isso deixava-me furiosa, e quando voltava a controlar o meu corpo tinha de inventar mentiras e mais mentiras para encobrir as asneiras dela. Chris andava mais desconfiado que nunca.
            - Eu acho que há vezes em que tu soltas o teu lado negro. - Riu-se ele, certa vez, quando estávamos os dois sozinhos num dos sofás da Sala de Convívio.
            - Eu? - Perguntei, embasbacada.
            - Sim. Ages de uma maneira diferente. Mas depois é como se te arrependesses do que andas a fazer e voltas a ser a minha Kia.
            Agarrei o rosto dele entre as minhas mãos e beijei-o só para que ele não continuasse a falar e a dizer aquelas coisas que me deixavam em pânico. Chris entendia muito melhor a situação do que aparentava. Ou seria o contrário, e era eu quem estava a perder o jeito de mentir? Fosse como fosse, namorar com ele era um risco elevado.
            No entanto eu gostava demasiado dele para acabar tudo.
            Chris era carinhoso e tão leal que eu queria estar com ele 24 horas por dia. E era quase o que acontecia, apesar de estarmos rodeados pelos nossos amigos na maioria das vezes. Mas eu até preferia ter Sophie, Niza, Ryan e Peter ao pé de nós, pois assim Chris não tinha oportunidade de me hipnotizar e obrigar a revelar o meu segredo. Com o grupo à minha volta eu nunca ficava a olhar directamente para Chris durante muito tempo.
            Pelo menos era isso que eu julgava que se passaria daí em diante. Porque nunca pensei em ter de revelar o meu segredo.
           

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